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segunda-feira, outubro 02, 2006

Naquela noite

A ansiedade aumentava na mesma velocidade com que o instante se aproximava. Procurava não pensar no assunto. Já estava decidido e não queria tremer na hora H. Sabia tudo que ia falar. Estava na ponta da língua, como um ator que decora um roteiro.

Sabia também que, embora pareça, a vida não é um filme. Ele erraria toda a fala e, ao olhar nos olhos dela, esqueceria boa parte do texto, tendo inevitavelmente que depender de seu improviso. Mas não queria ter mais tempo para ensaios. Sabia que não adiantaria.

A hora se aproximava. Foi de carro até lá. Procurou no rádio músicas que o encorajassem. Por um momento, pensou que poderia dar tudo errado. Mas logo fez questão de se convencer: ela estaria ali, em frente à casa dela, no portão. Não seria desta vez que a vida lhe pregaria uma peça com os tais desencontros que só adiavam essa situação.

De fato ela estava lá, sentada, esperando. Viu-a com aquele sorriso pelo qual se apaixonara desde o primeiro momento. Depois, deixou pra trás o close na boca para contemplar o rosto lindo de menina moça pelo qual sempre suspirara.

Não conseguiu mais olhar. Suas pernas tremeram assim que ela entrou no carro. Ele olhou para o vazio, a procura de qualquer paisagem. O coração bateu mais forte. A adrenalina foi a mil.

E a primeira gota de suor gelado lhe escorreu do rosto assim que ela pegou sua mão. Sorridente, ela sabia que poderia falar com ele sem muitos rodeios. Sempre foi assim, desde a infância.

A voz dela, doce e suave, a perguntar o que você queria me falar?, ressoou na cabeça do garoto, fazendo-o ensurdecer para todas aquelas palavras que decorara. Tudo o que tanto repetiu para guardar em sua memória agora sumia diante de um grito em forma de suspiro.

Virou para ela e respirou. Em vez de oxigênio, entrou pelas suas narinas aquele aroma inconfundível, que mostrava toda a doçura da garota. Entorpecido, passou a mão em seu rosto e pensou apenas naquela frase.

Acabaram-se os textos decorados. E com um pragmatismo que nunca pensara ter, falou as únicas palavras pelas quais estava lá:

- Não dá mais. Acabou. Adeus.

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